Era Outubro de 1996. Eu tinha apenas 26 anos, mas carregava comigo o tédio de alguém que já vivera 80 e acreditava estar satisfeito com o que a vida lhe dera aguardando ansiosamente a hora de abandoná-la (sentimento de um ancião do século XIX povoando a cabeça de uma menina do século XX).
Entre sonhos concretizados e amor mal resolvido, numa crise de insônia, sob meus edredons pra lá de macios e sobre travesseiros de penas de ganso, descobri que um desejo de infância ainda não tinha sido saciado: eu não não tivera uma árvore de Natal!
Nem dormi mais naquela noite tamanha a euforia em querer adquirir "a minha última conquista". Bati tanta perna durante o dia percorrendo lojas, escolhendo cores, bolas e fitas que só aguentei montar a bendita no dia seguinte.
Minha "obra de arte" ficou linda, mas ao contemplá-la percebi que não a queria apenas, precisava vê-la cheia de presentes a sua volta. Meu lado infantil frustrado pela minha mãe que nunca dera muita importância à decoração natalina, pedia com gritinhos uma árvore completa.
Era só, vivia só e com pouquíssimos amigos. Decidi então comprar presentes para toda a parentada, mesmo os mais distantes. O que comprar? A criançada ganhou uma caixa de bombom e os adultos...
Bom, como estava movida pelo sentimento de despedida, de fim de linha mesmo, pensei em algo que secretamente saciasse minha vontade de responder aos que de certa forma me recriminaram ou me discriminaram pela minha escolha de vida, pois eu era "a ovelha desgarrada", então "voilà!", mandei todos tomar banho, literalmente! Comprei esponja e sabonete líquido para todo mundo (até hoje não sei se alguém captou a minha intenção).
Tarefa cumprida, meu último Natal programado, árvore lotada de presentes cuidadosamente embrulhados ao seu redor, depois de fotografá-la, suspirei admirando suas luzinhas acesas. Meus olhos piscando junto com estas não conseguiram conter a represa de lágrimas que se rompeu diante do "meu último desejo em vida"...
Então, ao contemplá-la mais uma vez, meu anjo sussurrou ao meu ouvido "ainda falta uma coisa!"...o que poderia ser?...mais bolas?...mais laços?...mais luzes?...E eu ouvi direitinho "falta a criança que pediu a árvore!"...como assim?
Naquele exato momento tive a certeza de que ter uma árvore de Natal não era mais o meu "último desejo" e bem escondidinho coloquei pendurada nela um papelzinho escrito o meu pedido de Natal. Era um segredo entre nós, coisa de cúmplices, do tipo que nem morta a gente revela. No ano seguinte, dei-lhe uma piscadinha e ao seu pé coloquei o presente mais valioso recebido em toda a minha vida: a minha filha, minha companheirinha, que junto trouxe de volta toda a vontade de viver que um dia eu julgara perdida...
Dizem que o Homem não deve passar pela Terra sem plantar uma árvore, ter um filho e escrever um livro. Eu já tive uma árvore, escrevi um filho e só me falta plantar um livro. Quem sabe esta crônica não sirva como semente?
Meire J.Costa
26.11.10